A Doutrina Secreta - Prefácio de Helena Blavatsky

PREFÁCIO DA PRIMEIRA EDIÇÃO

A AUTORA - ou mais propriamente a escritora - sente-se no dever de justificar a demora no aparecimento desta obra. As causas foram o seu estado de saúde e a magnitude do empreendimento. Os dois volumes que saem à luz ainda não completam o plano, nem esgotam o assunto que lhes constitui o objeto. Já se acha preparada boa quantidade de materiais referentes à história do Ocultismo, proporcionados pelas vidas dos grandes Adeptos da Raça ariana e que nos mostram a influência da Filosofia Oculta no comportamento da vida, tal como é e como deve ser. Se os presentes volumes tiverem acolhida favorável, não serão poupados esforços para levar avante e completar a obra.

Quando pela primeira vez se anunciou a elaboração deste trabalho, não era o plano atual que se tinha em vista. Conforme fora noticiado de início, havia a intenção de que a Doutrina Secreta representasse uma versão ampliada e corrigida de Ísis sem Véu. Não se tardou, porém, a verificar que as explicações a serem dadas ao mundo, em aditamento às constantes do último livro, e de outros que também se ocuparam da Ciência Esotérica, exigiam, por sua natureza, um método diferente de exposição; e é por isso que os volumes atuais não contêm, em sua totalidade,' sequer vinte páginas reproduzidas de Ísis sem Véu.

A autora não julga necessário pedir a indulgência dos leitores e dos críticos para os numerosos defeitos no tocante ao estilo literário e ao manejo da língua inglesa, que possam ser observados nestas páginas. É uma estrangeira, e o conhecimento desse idioma lhe veio em idade já algo avançada.

O inglês foi adotado por ser o meio de mais ampla difusão para servir de veículo às verdades que lhe cumpre apresentar ao mundo.

Tais verdades não são, de modo algum, expostas com o caráter de. revelação; nem a autora tem a pretensão de se fazer passar por uma reveladora de conhecimentos místicos que fossem agora trazidos à luz pela primeira vez na história. A matéria contida nesta obra pode-se encontrar esparsa nos milhares de volumes que encerram as Escrituras das grandes religiões asiáticas e das primitivas religiões europeias - oculta sob hieróglifos e símbolos, e até então despercebida por causa desse véu. O de que aqui se cogita é reunir as mais antigas doutrinas e sobre elas formar um conjunto harmônico e contínuo. A única vantagem em' que sobrelevo aos meus predecessores é a de não precisar recorrer a especulações ou teorias pessoais.

Porque esta obra não representa mais do que uma exposição parcial de ensinamentos recebidos de estudantes mais adiantados, com o adminículo tão-somente, no que concerne a alguns pormenores, dos resultados do meu próprio estudo e observação. A publicação de muitos dos fatos aqui mencionados se torna necessária em razão das estranhas e fantásticas especulações a que se deram vários teósofos e estudantes de misticismo nestes últimos anos, no afã de construírem um sistema completo, deduzido do pequeno número de fatos que lhes foram transmitidos.

Escusado é dizer que esta obra não é a Doutrina Secreta em sua totalidade; contém apenas um número selecionado de fragmentos dos seus princípios fundamentais, dando-se especial atenção a certos fatos com os quais diversos escritores se têm preocupado, desfigurando-os, porém, ao ponto de retirar-lhes toda verossimilhança.

Apesar disso, será talvez conveniente declarar, em termos inequívocos, que os ensinamentos consubstanciados nestes dois volumes, por mais incompletos e fragmentários que sejam, não pertencem exclusivamente nem à religião hindu, nem à de Zoroastro, nem à da Caldeia, nem à egípcia; e tampouco ao Budismo, ao Islamismo ou ao Cristianismo. A Doutrina Secreta é a essência de todas elas. E como os diferentes sistemas' religiosos tiveram sua origem na Doutrina Secreta, trataremos de fazê-Ios retroagir ao seu elemento original, de onde todos os mistérios e dogmas se desenvolveram, vindo a materializar-se.

É bem provável que grande parte do público considere a obra como uma novela das mais extravagantes. Quem já ouviu alguma vez falar do Livro de Dzyan?

Sem embargo, está a escritora resolvida a assumir inteira responsabilidade por tudo quanto se contém neste livro, e ainda arrostar com a acusação de haver tudo inventado. Que há muitas deficiências, ela o sabe perfeitamente; mas a única coisa que deseja e solicita em favor da obra é que, embora a muitos se afigure romântica, a sua tessitura lógica e a sua coerência confiram títulos a este novo Gênesis, que o ponham ao nível, pelo menos, das 'hipóteses fecundas' tão livremente aceitas pela Ciência moderna.

A obra, ademais, merece ser considerada, não porque invoque alguma autoridade dogmática, mas por se manter em íntima relação com os fatos da Natureza e seguir as leis da uniformidade e da analogia.

O objetivo deste trabalho pode ser assim expresso: demonstrar que a Natureza não é 'uma aglomeração fortuita de átomos', e assinar ao homem o lugar que por direito lhe compete no plano do Universo; evitar que sejam desvirtuadas as verdades arcaicas que constituem a base de todas as religiões; descobrir, até certo ponto, a unidade fundamental que se acha na raiz de todas elas; e, finalmente, mostrar que a Ciência da civilização hodierna jamais se aproximou do lado Oculto da Natureza.

Se isso for de algum modo conseguido, a autora dar-se-á por satisfeita. Ela escreveu a serviço da Humanidade; deve ser julgada pela Humanidade e as gerações futuras. Não reconhece tribunal de apelação inferior a esse. Está acostumada às injúrias, e em contato diário com a calúnia; e encara a maledicência com um sorriso de silencioso desdém .

De minimis non curat lex.

H. P. B.

Londres, outubro de 1888.

A Doutrina Secreta, vol. 1, Helena Blavatsky, Ed. Pensamento,




 

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